Recomendações do Fórum das Nações Unidas sobre Questões de Minoria

Link para documento original

Link para tradução em PDF (em breve)

Tradução não oficial realizada pelo Centro Brasileiro de Estudos em Direito e Religião – CEDIRE

Non-official translation by the Brazilian Center of Studies in Law and Religion – CEDIRE

Nações Unidas A/HRC/25/66

 Assembleia Geral

Dist.: Geral

22 de janeiro de 2014

Original: Inglês

GE.14-10471  |   *1410471*


Vigésima quinta sessão

Conselho de Direitos Humanos 

Ponto 3 da ordem do dia


Promoção e proteção de todos os direitos humanos, direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais, incluindo o direito ao desenvolvimento


Recomendações do Fórum sobre

Questões de Minorias em sua sexta sessão:

Garantindo os direitos das minorias religiosas

(26 e 27 de novembro de 2013)

 

Conteúdo


I. Introdução................................................................................................................. §1−§6

II Considerações gerais............................................................................................... §7−§13

III Recomendações........................................................................................................ §14−§68

A. Recomendações gerais .......................................................................................... §14−§16

B. Implementação de normas internacionais na legislação nacional ............ §17−§25

C. Políticas e programas............................................................................................. §26−§35

D. Consulta e participação.......................................................................................... §36−§39

E. Educação.................................................................................................................... §40−§45

F. Formação e sensibilização .................................................................................... §46−§48

G. Pesquisa e dados...................................................................................................... §49−§52

H. Prevenção da violência e proteção da segurança de minorias religiosas.... §53−§64

I. Diálogo inter-religioso, consulta e intercâmbio .............................................. §65−§68

 

I. Introdução


1. O presente documento, elaborado de acordo com a resolução 19/23 do Conselho de Direitos Humanos, contém as recomendações que emanaram da sexta sessão do Fórum, que buscou fornecer resultados concretos e tangíveis sob a forma de recomendações temáticas de valor prático a todas as partes interessadas.

2. A sexta sessão do Fórum sobre Questões de Minorias, realizada em 26 e 27 de novembro de 2013, centrou-se em medidas práticas e concretas destinadas a garantir os direitos das minorias religiosas. A presidente da sessão foi Hedina Sijerčić da Bósnia e Herzegovina. O trabalho do Fórum foi orientado pela Perita Independente em Questões de Minorias, Rita Izsák. Os participantes, que totalizaram mais de 500 pessoas, incluíram representantes de governos, numerosos representantes de comunidades minoritárias de todas as regiões do mundo, e representantes de órgãos de tratados, procedimentos especiais, agências especializadas das Nações Unidas, órgãos intergovernamentais regionais, instituições nacionais de direitos humanos e sociedade civil.

3. As recomendações contidas no presente documento são confeccionadas e dirigidas para a vasta gama de partes interessadas responsáveis pela promoção e proteção dos direitos das minorias, incluindo Estados membros das Nações Unidas, agências, fundos e programas das Nações Unidas, instituições nacionais de direitos humanos, organizações da sociedade civil e pessoas pertencentes a minorias nacionais ou étnicas, religiosas e linguísticas como portadoras desses direitos.

4. As recomendações baseiam-se na Declaração sobre os Direitos das Pessoas Pertencentes a Minorias Nacionais ou Étnicas, Religiosas e Linguísticas (1992), bem como em outras normas e princípios internacionais e regionais de direitos humanos desenvolvidos por diferentes partes interessadas e legislação nacional. A jurisprudência e os comentários gerais dos órgãos do tratado, bem como relatórios e recomendações pertinentes de diferentes procedimentos especiais, incluindo o trabalho do Relator Especial para a Liberdade de Religião ou Crença, informaram as presentes recomendações. Este documento também reflete todos os contributos recebidos dos participantes no Fórum.

5. A gama de questões incluídas nas recomendações não é exaustiva. Espera-se que as recomendações sejam interpretadas de forma construtiva, em cooperação e diálogo aberto com as comunidades religiosas minoritárias, à luz das obrigações dos Estados de implementar efetivamente os padrões de direitos humanos na prática.

6. As recomendações são redigidas em termos gerais e podem ser implementadas em países com diversas origens históricas, culturais e religiosas. Existe uma grande variedade de situações nacionais e minoritárias e, consequentemente, podem ser necessárias diferentes medidas para promover e proteger os direitos das pessoas pertencentes a minorias dentro de um determinado Estado. O Fórum reiterou igualmente o fato de que essas medidas devem ser monitoradas e revistas regularmente, de modo a garantir que estas atinjam os seus objetivos exigidos. O Fórum tem enfatizado consistentemente que as soluções padrão geralmente não são possíveis nem desejáveis, e que suas recomendações devem, portanto, ser usadas como fonte de orientação geral.


II. Considerações gerais 


7. Uma abordagem inclusiva para definir quais grupos se enquadram no âmbito das minorias religiosas seria aquela que está de acordo com o comentário geral n. 23 (1994) do Comitê de Direitos Humanos sobre os direitos das minorias, o qual enfatiza que “a existência de uma minoria étnica, religiosa ou linguística em um determinado Estado Parte não depende de uma decisão desse Estado Parte, mas exige que seja estabelecida por critérios objetivos” (par. 5.2). Em seu comentário geral n. 22 (1993) sobre o direito à liberdade de pensamento, consciência e religião, o Comitê sublinhou ainda que os termos “crença” e “religião” devem ser interpretados de modo amplo e que a aplicação do artigo 18 do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos não deve ser limitada às religiões tradicionais ou oficiais. O Estado deve, portanto, assegurar também a não discriminação e o igual gozo dos direitos humanos para as comunidades religiosas menores, dispersas ou recém-chegadas. O direito dos indivíduos de se identificarem como pertencentes a uma minoria religiosa ou de não o fazer deve ser reconhecido, e as discussões não devem ser limitadas a grupos oficialmente reconhecidos.

8. O termo “minorias religiosas”, como utilizado no presente documento, abrange, portanto, uma ampla gama de comunidades religiosas ou de crenças, tradicionais e não tradicionais, reconhecidas pelo Estado ou não, incluindo grupos de fé ou crença mais recentemente estabelecidos, e grandes e pequenas comunidades, que buscam a proteção de seus direitos sob os padrões dos direitos das minorias. Não crentes, ateus ou agnósticos também podem enfrentar desafios e discriminação e requerer a proteção de seus direitos. De igual modo, deve ser dada atenção à situação das minorias religiosas onde elas formam uma minoria numa determinada região ou localidade, mas não no país como um todo.

9. A diversidade que existe dentro dos grupos religiosos minoritários deve ser reconhecida. Os direitos de cada membro de tais grupos minoritários devem ser plenamente respeitados. As minorias religiosas também podem ser minorias nacionais, étnicas ou linguísticas. A discriminação contra elas pode ser composta, interseccional e baseada não apenas em sua identidade religiosa, mas também em sua identidade étnica, linguística ou outra, e em percepções delas como sendo os “outros” ou não totalmente pertencentes. Mulheres e meninas pertencentes a minorias religiosas podem experimentar formas múltiplas ou interseccionais de discriminação no curso de suas interações dentro e fora de seu grupo. Uma perspectiva de gênero que tenha em conta as formas de discriminação múltiplas e interseccionais que mulheres e meninas minoritárias poderão enfrentar é crucial ao abordar os direitos das minorias e a situação das mulheres e meninas minoritárias num dado grupo religioso minoritário e num determinado país.

10. Nos seus esforços para garantir os direitos das minorias religiosas, todas as partes interessadas são encorajadas a referir-se às recomendações substantivas e orientadas para a ação construídas nas cinco sessões anteriores do Fórum, centrando-se nas principais áreas temáticas das minorias e no direito à educação, participação política efetiva, participação efetiva na vida econômica, formas de garantir os direitos das mulheres e meninas minoritárias e implementação efetiva da Declaração.1 Estas recomendações aplicam-se igualmente às minorias religiosas e devem ser consideradas complementares às recomendações contidas no presente documento, que visam abordar áreas específicas de preocupação para as minorias religiosas.

11. Todas as medidas tomadas com vistas à aplicação das recomendações formuladas na sessão do Fórum deverão ser, na medida do possível, desenvolvidas, concebidas, implementadas e revistas com a participação plena e eficaz das minorias religiosas, incluindo as mulheres. As condições que permitem essa colaboração e os mecanismos que facilitam a consulta devem ser postos em prática por todos os intervenientes. Devem também ser envidados esforços para assegurar que as diversas opiniões dentro dos grupos minoritários, incluindo aquelas dos líderes religiosos e de outros membros da comunidade, sejam procuradas e tidas em conta no processo. Devem ser envidados todos os esforços para assegurar que o princípio da autoidentificação/autocompreensão dos membros das minorias religiosas seja respeitado.

12. Representantes de comunidades minoritárias, incluindo associações, organizações, instituições tradicionais de liderança, órgãos religiosos e outras instituições livremente estabelecidas pelas próprias minorias religiosas de acordo com seus próprios princípios e tradições, devem estar envolvidas em um processo participativo significativo em todos os aspetos da implementação das recomendações.

13. O Fórum congratula-se com as informações recebidas das partes interessadas sobre as diferentes medidas que foram tomadas até à data para implementar as suas recomendações de sessões anteriores. Todas as partes interessadas são encorajadas a continuar esse engajamento e compartilhamento de informações.


III. Recomendações


A. Recomendações gerais

14. As disposições da Declaração sobre os Direitos das Pessoas Pertencentes a Minorias Nacionais ou Étnicas, Religiosas e Linguísticas devem ser traduzidas pelos Estados para a legislação nacional. Todos os Estados devem implementar plenamente a Declaração, tendo em conta a situação das minorias religiosas presentes no país. Aos membros das minorias religiosas devem ser garantidas a implementação de toda a gama de direitos ao abrigo da Declaração, reconhecendo que estes incluem o direito à liberdade de religião ou crença, e vão além.

15. Os Estados devem cumprir e implementar plenamente o artigo 18 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, o artigo 18 do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos e a Declaração sobre a Eliminação de Todas as Formas de Intolerância e Discriminação baseadas na Religião ou Crença, e outras normas internacionais relacionadas com a liberdade de religião ou crença, levando em consideração especificamente as questões de particular preocupação para as minorias religiosas, que podem experimentar discriminação, marginalização e estigmatização, e que podem exigir uma atenção maior e direcionada para garantir seus direitos.

16. Os Estados devem considerar a aplicação, quando apropriado, de medidas especiais que abordem a discriminação e a desigualdade vivenciadas por pessoas pertencentes a minorias religiosas. A atenção institucional às minorias religiosas deve ser reforçada, conforme adequado, a fim de facilitar tais medidas e melhorar a integração das questões minoritárias nos órgãos nacionais, incluindo ministérios ou departamentos governamentais que trabalham com preocupações centrais para as minorias, instituições nacionais de direitos humanos, órgãos e mecanismos consultivos e outras entidades nacionais relevantes.


B. Implementação de normas internacionais na legislação nacional

17. Os Estados devem assegurar que não haja tratamento discriminatório no que diz respeito ao reconhecimento jurídico e administrativo de todos os grupos religiosos e de crenças. Quaisquer procedimentos administrativos e de registro, incluindo os relativos à propriedade e ao funcionamento dos locais de culto e de outras instituições religiosas, devem ser conduzidos de acordo com as normas de não discriminação. As normas internacionais não permitem que o não reconhecimento de grupos religiosos ou de crenças resulte em negação de seus direitos. Tais normas exigem uma abordagem inclusiva a ser adotada.

18. A legislação existente deve ser revista para garantir que não existam disposições legislativas discriminatórias ou que tenham um impacto discriminatório direto ou indireto sobre as pessoas pertencentes a minorias religiosas. Além disso, requisitos e procedimentos oficiais resultantes da aplicação das leis — e seus possíveis impactos discriminatórios em determinados indivíduos e grupos — devem ser revistos e alterados.

19. Os Estados devem adotar uma legislação antidiscriminação doméstica que inclua disposições que proíbam a discriminação direta e indireta contra pessoas pertencentes a minorias religiosas. Os governos devem garantir a implementação de tal legislação, inclusive a nível local. Devem ainda garantir que os remédios sejam disponibilizados e facilmente acessíveis às minorias religiosas, e que sejam aplicadas sanções adequadas em caso de violação.

20. Os Estados não devem exercer qualquer influência indevida sobre os assuntos das minorias religiosas, inclusive no que diz respeito à nomeação de líderes religiosos, ao funcionamento de locais de culto e a quaisquer atividades legítimas baseadas na religião ou crença.

21. Os Estados que ainda não adotaram leis que protejam contra o incitamento ao ódio religioso, à discriminação religiosa e à hostilidade ou à violência contra minorias religiosas, devem fazê-lo de acordo com as normas internacionais e as boas práticas aplicáveis, e devem garantir que as sanções sejam adequadas e de fato aplicadas.

22. Os Estados devem proteger as liberdades interdependentes de religião e de expressão que, em conjunto, englobam os direitos de ensinar, fazer proselitismo e criticar qualquer religião, ao mesmo tempo que incentivam uma coexistência respeitosa e pacífica.

23. Os Estados devem assegurar que a legislação e as políticas antiterrorismo e a sua aplicação não levem a consequências negativas para os membros de grupos religiosos, especialmente como resultado do perfilamento religioso. O perfilamento religioso no contexto das medidas antiterrorismo deve ser proibida por lei.

24. As leis sobre a blasfêmia, bem como as disposições relativas a infrações relacionadas com as religiões, devem ser revogadas e substituídas por disposições que estejam em conformidade com as normas internacionais aplicáveis em matéria de direitos humanos, incluindo em relação ao direito à liberdade de religião ou de crença, e o direito das pessoas de mudar livremente sua religião ou crença, se assim o desejarem.

25. Práticas tradicionais prejudiciais baseadas na religião ou na crença que violem os direitos humanos de qualquer indivíduo devem ser proibidas por lei e tratadas em conformidade com as normas internacionais. Sempre que adequado, devem ser realizadas consultas com líderes e membros de comunidades religiosas para abordar tais questões e suas causas.


C. Políticas e programas

26. Os Estados devem demonstrar seu compromisso em proteger os direitos das minorias religiosas, garantindo que as questões que lhes dizem respeito sejam consistentemente integradas e refletidas nas políticas e programas governamentais. Devem ser implementadas abordagens baseadas nos direitos das minorias que sejam abrangentes e que reconheçam que as pessoas pertencentes a minorias religiosas, incluindo as mulheres, podem exigir uma atenção especial e medidas positivas para garantir o pleno gozo dos seus direitos à não discriminação e à igualdade em todos os aspetos da sociedade cultural, religioso, social, econômico e político.

27. A composição das instituições nacionais, incluindo os órgãos governamentais e os empregadores públicos, deve ser revista periodicamente para garantir que sejam representativas das minorias religiosas presentes na sociedade. Os Estados devem promover o recrutamento de pessoas pertencentes a minorias religiosas, incluindo mulheres pertencentes a minorias religiosas, para suas instituições, incluindo órgãos nacionais, públicos e governamentais.

28. Devem ser tomadas medidas para garantir o acesso à justiça das pessoas pertencentes a grupos religiosos minoritários, tais como a capacitação de funcionários públicos e responsáveis pela aplicação da lei em matéria dos direitos contidos na Declaração e na legislação interna que são relevantes para os direitos de minorias religiosas. Devem ser envidados esforços para aumentar a representação das minorias religiosas nos órgãos de aplicação da lei, no poder judiciário e em outras instituições públicas relevantes.

29. Como previsto na Declaração, os Estados devem se envolver com os Estados vizinhos e próximos dos quais as minorias religiosas emanam e/ou mantêm contatos pacíficos. Devem promover intercâmbios positivos e fornecer apoio religioso e/ou cultural adequado às comunidades religiosas, e apoiar-lhes a estabelecer e manter contatos pacíficos com outros membros do seu grupo, tanto no seu próprio país como nas fronteiras do Estado.

30. Os agentes econômicos, incluindo as empresas privadas, bem como os organismos representativos dos trabalhadores, como os sindicatos, devem assegurar que as minorias religiosas e os seus deveres religiosos específicos sejam razoavelmente acomodados no local de trabalho. Os sindicatos devem, por exemplo, capacitar-se a respeito dos desafios que as minorias religiosas enfrentam no mercado de trabalho do seu país e procurar envolver os agentes responsáveis pela construção de políticas e os empregadores na busca por soluções.

31. As instituições nacionais de direitos humanos devem capacitar-se a respeito da diversidade religiosa dentro do Estado em questão e garantir ativamente que os desafios enfrentados pelos grupos religiosos sejam abordados em seu trabalho. Conforme apropriado às circunstâncias nacionais, devem considerar a criação de uma unidade especializada e/ou escritórios regionais e o desenvolvimento de diretrizes sobre questões de minorias religiosas. Devem promover e assegurar a representação dessa diversidade religiosa no seu próprio secretariado e pessoal.

32. Os Estados devem considerar a criação de uma ouvidoria/instituição independente especialmente encarregada de receber queixas e iniciar investigações sobre violações dos direitos das minorias religiosas por atores estatais e não estatais. Essa instituição deve desempenhar um papel ativo no desenvolvimento e supervisão da implementação de políticas, programas e legislação, e na identificação de áreas-alvo, em colaboração com os governos locais, regionais e nacionais.

33. Sempre que as minorias religiosas constituam a maioria numa determinada região ou localidade, podem ser consideradas adequadas disposições de autonomia cultural e/ou política, tendo devidamente em conta a garantia dos direitos daqueles que podem constituir uma minoria nessas localidades. Tais disposições devem ser estabelecidas com a participação significativa das minorias.

34. Devem ser tomadas medidas para proteger e manter o patrimônio cultural das minorias religiosas, incluindo edifícios, monumentos, cemitérios e outros locais de importância religiosa, bem como os documentos, registros e artefatos pertencentes a minorias religiosas.

35. Todos os Estados devem tomar medidas para implementar o Plano de Ação de Rabat sobre a proibição da defesa do ódio nacional, racial ou religioso que constitua incitamento à discriminação, à hostilidade ou à violência.


D. Consulta e participação

36. São necessárias medidas positivas para assegurar a consulta e a participação de todas as minorias religiosas em todos os níveis da sociedade. A inclusão das minorias religiosas nos órgãos consultivos e de tomada de decisão ajuda a garantir que suas opiniões, questões e preocupações sejam consideradas. Os Estados devem facilitar a criação de órgãos e mecanismos destinados a criar um espaço de discussões e intercâmbios sobre questões relevantes para as minorias religiosas.

37. Os Estados devem realizar consultas abertas com toda a gama de grupos religiosos minoritários e com a sociedade em geral sobre medidas para melhorar o respeito por todos os direitos humanos das pessoas pertencentes a minorias religiosas.

38. Devem ser tomadas e promovidas medidas destinadas a melhorar a representação e a participação das minorias religiosas em todos os domínios da vida, incluindo iniciativas específicas de recrutamento e formação, nos setores público e privado. As minorias religiosas, incluindo as de comunidades menores, devem ser representadas em órgãos de supervisão e de regulamentação relacionados, por exemplo, com serviços de aplicação da lei, instituições políticas e meios de comunicação social.

39. Os Estados devem promover o acesso equitativo das minorias aos meios de comunicação, bem como às tecnologias e ferramentas de informação e comunicação, incluindo a Internet e os canais de redes sociais. Esses canais constituem um importante veículo para a divulgação de informação e partilha de boas práticas, para incentivar a participação efetiva das minorias religiosas, incluindo os jovens, em todas as esferas da vida, e para promover um espírito de aceitação em todos os níveis e nas discussões inter-religiosas.


E. Educação

40. Os Estados devem assegurar que o ambiente educativo nacional garanta o acesso igual aos que pertencem às minorias religiosas. Eles também devem garantir que seja acolhedor e não discriminatório, e que os estudantes pertencentes a grupos religiosos minoritários tenham a oportunidade de aprender sobre sua própria religião, manifestar sua religião, participar de seus feriados religiosos e aprender sobre as religiões e crenças de outros.

41. Os governos devem desenvolver e implementar políticas educacionais inclusivas e direcionadas que proporcionem acesso a ambientes de aprendizagem de alta qualidade para todas as pessoas pertencentes a minorias religiosas. Devem ser adotadas abordagens de educação intercultural sensíveis às minorias, com especial atenção à reflexão da pluralidade e à contribuição positiva das minorias religiosas para a sociedade, e à luta contra estereótipos e mitos negativos sobre as suas crenças e grupos.

42. Sempre que a educação pública inclua instrução numa religião ou crença específica, devem ser previstas isenções ou alternativas não discriminatórias para acomodar os desejos e os requisitos/necessidades de educação religiosa das minorias religiosas. A instrução em assuntos como a história geral das religiões, nos casos em que é oferecida, deve ser conduzida com o objetivo de promover a compreensão e o diálogo inter-religioso. Devem ser tomadas medidas para garantir que as crianças (juntamente com seus pais/responsáveis legais) possam escolher se devem ou não participar de aulas de educação religiosa.

43. Deve ser dada especial atenção às necessidades educativas das meninas pertencentes a minorias religiosas. Garantir que tenham igual acesso à educação pode exigir um diálogo com e no seio das comunidades religiosas, que se destina a formular abordagens adequadas baseadas nos direitos humanos para questões como as barreiras culturais à igualdade de acesso à educação para as meninas, e às exigências de vestimenta nas escolas, incluindo a proibição de lenços de cabeça.

44. Devem ser tomadas medidas para fazer face às barreiras existentes que possam, direta ou indiretamente, impedir que algumas minorias religiosas, incluindo as mulheres minoritárias, acedam ao ensino superior devido à sua filiação religiosa. Isso poderia ser feito, por exemplo, por meio do desenvolvimento de esquemas de ação afirmativa em políticas educacionais para membros de minorias religiosas.

45. A educação em direitos humanos deve integrar uma componente dos direitos das minorias e dar especial atenção às minorias religiosas, conforme apropriado. Os governos devem colaborar com atores e organizações de minorias religiosas no desenvolvimento de materiais relevantes para os direitos das minorias religiosas e as comunidades religiosas do Estado, e garantir que as questões minoritárias sejam plenamente refletidas e integradas nos currículos escolares. Os textos escolares devem ser revisados para garantir que eles reflitam e são apropriados para as minorias religiosas, e não transmitam estereótipos negativos sobre eles, ou sobre a religião majoritária, se houver.


F. Formação e sensibilização

46. Todos os atores devem tomar iniciativas de sensibilização sobre questões que afetam as minorias religiosas. Isso deverá incluir campanhas sobre os direitos das pessoas pertencentes a minorias religiosas, com atividades destinadas à promoção da Declaração e da legislação nacional pertinente, bem como informações sobre os organismos especializados existentes em matéria de direitos das minorias e de igualdade, departamentos ou agências, bem como sobre os seus serviços. O alcance deve ser direcionado para as comunidades religiosas minoritárias, inclusive por intermédio dos meios de comunicação minoritários e em localidades e línguas minoritárias, bem como para a sociedade em geral.

47. Em conformidade com a Declaração, os Estados devem tomar medidas para incentivar o conhecimento das religiões, da história, das tradições, da língua e da cultura das minorias religiosas que existem em seu território. As medidas para informar a sociedade em geral podem incluir, por exemplo, o desenvolvimento de materiais informativos sobre história, cultura, tradições e contribuições positivas para a sociedade dos diferentes grupos religiosos presentes no Estado, bem como iniciativas midiáticas para incentivar o conhecimento sobre as minorias religiosas.

48. As iniciativas de capacitação sobre direitos das minorias, não discriminação e igualdade, liberdade de religião ou crença, e boas práticas e metodologias devem ser consideradas em todas as instituições públicas relevantes. Os funcionários públicos e os agentes responsáveis pela aplicação da lei devem receber essa formação e devem ser criados mecanismos de monitoração e supervisão para identificar e punir comportamentos discriminatórios quando se trata de minorias religiosas, especialmente em casos de exclusão ou assédio intencional e perfilamento religioso ou étnico.


G. Pesquisa e dados

49. Os Estados devem realizar exercícios de pesquisa e coleta de dados, inclusive no contexto de inquéritos censitários nacionais, com o objetivo de compilar informações detalhadas sobre a situação demográfica e socioeconômica das minorias religiosas em seu país.

50. Devem ser recolhidos dados desagregados de natureza quantitativa e qualitativa e que incluam a consideração da situação das minorias religiosas em relação a outros membros da sociedade. A pesquisa deve avaliar a liberdade das pessoas pertencentes a minorias religiosas para praticarem a sua religião, cultura e tradições, e deve considerar áreas-chave de preocupação sobre tais minorias, incluindo o acesso a uma educação de qualidade, emprego, saúde e habitação, e a capacidade de participar eficazmente na vida pública.

51. Os organismos nacionais de estatística devem ser encarregados de recolher dados sobre as minorias religiosas. Os governos também devem considerar, quando necessário, o apoio ao trabalho de organizações não governamentais e centros de pesquisa para iniciar projetos de pesquisa relevantes para as minorias religiosas no Estado/região, quando necessário. Em todas as circunstâncias, a equipe de pesquisa e censo deve ser devidamente treinada para coletar dados com sensibilidade cultural em diversas comunidades de fé.

52. Um quadro completo da diversidade religiosa e de crença em um Estado deve incluir todos os grupos religiosos e de crenças. A coleta de dados deve ser realizada de forma sensível e voluntária, consistente com o direito das minorias religiosas à autoidentificação, com pleno respeito pela privacidade e anonimato das pessoas envolvidas e de acordo com as normas internacionais de proteção de dados pessoais.


H. Prevenção da violência e proteção da segurança das minorias religiosas

53. Os Estados têm a responsabilidade de garantir os direitos humanos e a segurança para todas as pessoas e de criar condições de paz e estabilidade. Eles devem agir de forma adequada e rápida para proteger os direitos e a segurança das pessoas pertencentes a minorias religiosas sob ameaça, e processar qualquer pessoa que cometa, apoie ou incite a violência contra elas.

54. Todos os Estados devem ratificar e implementar a Convenção sobre a Prevenção e Punição do Crime de Genocídio, que criminaliza atos cometidos com a intenção de destruir, no todo ou em parte, grupos nacionais, étnicos, raciais ou religiosos. Devem adotar políticas para a prevenção do incitamento a crimes atrozes que foram desenvolvidas pelo Escritório de Prevenção de Genocídio e a responsabilidade de proteger.

55. Sempre que necessário, os Estados devem cooperar ativamente com os atuais mecanismos de alerta precoce das Nações Unidas, tais como o Conselheiro Especial para a Prevenção do Genocídio e o Conselheiro Especial sobre a Responsabilidade de Proteger, no que diz respeito à prevenção da violência contra pessoas pertencentes a minorias religiosas. Devem também compartilhar boas práticas a esse respeito.

56. Devem ser tomadas medidas preventivas contra atos de violência dirigidos contra pessoas ou locais religiosos pertencentes a minorias religiosas. Em situações de risco extremo, as medidas preventivas adequadas devem ser rapidamente implementadas pelos organismos responsáveis pela aplicação da lei e adaptadas à medida que a situação evolui.

57. Os Estados devem garantir que todos os casos de intimidação, assédio, perseguição e outras violações graves dos direitos humanos contra pessoas pertencentes a minorias religiosas, incluindo através do uso de ferramentas e plataformas da Internet, sejam investigados de forma completa e imediata, e que os perpetradores sejam punidos. As medidas adequadas, incluindo a assistência jurídica, devem ser postas à disposição dos grupos religiosos minoritários, conforme necessário, a fim de documentar casos de violência ou intimidação, e processar efetivamente aqueles que cometem ataques contra eles e violência comunitária. Deve haver adequada reabilitação e compensação para as vítimas de violência comunitária.

58. Os Estados devem tomar medidas abrangentes contra discriminação, intolerância e, principalmente, hostilidade ou violência, tortura e assassinatos com base na religião ou crença. Se necessário, deverá ser adotada legislação nacional em conformidade com as normas internacionais pertinentes, a fim de criar bases jurídicas precisas e coerentes para condenar os perpetradores, levá-los à justiça e castigá-los, por todos os atos de violência.

59. O retrato negativo das minorias religiosas na mídia ou em discurso oficial ou político tem uma influência significativa sobre como elas podem ser percebidas pela população em geral, problema que deve ser enfrentado. Quando tal discurso equivale a discurso de ódio ou incitamento ao ódio religioso, devem ser aplicadas sanções legais adequadas, em conformidade com as normas internacionais.

60. Os Estados devem tomar todas as medidas necessárias para garantir que o discurso de ódio não tenha lugar no discurso público, inclusive na esfera política e na mídia, e que os efeitos de certas políticas, em particular as leis antiterrorismo, não tenham como alvo arbitrariamente minorias religiosas específicas.

61. Em situações de conflito, deve ser dada especial atenção à situação e à segurança das pessoas pertencentes a minorias religiosas vulneráveis. Devem ser envidados esforços para reintegrar plenamente, com dignidade, as comunidades religiosas que foram deslocadas internamente durante o conflito, para permitir o acesso a todos os locais de culto e a outros locais religiosos e para garantir a proteção das minorias religiosas presentes no território. Minorias religiosas de todas as religiões dentro de um Estado devem estar ativamente envolvidas, desde os primeiros estágios, em iniciativas de construção da paz e processos de reconciliação.

62. Os Estados devem tomar todas as medidas necessárias para garantir a proteção das comunidades religiosas minoritárias e dos defensores e representantes dos direitos humanos minoritários, incluindo as mulheres, que podem estar em maior risco de violência. Devem desenvolver programas de proteção eficazes, sempre que necessário, definidos por lei e que incluam sistemas de alerta precoce.

63. Nos países de acolhimento de trabalhadores migrantes, requerentes de asilo e refugiados, devem ser tomadas medidas para garantir que os tomadores de decisão e os oficiais de imigração tenham conhecimento sobre questões relacionadas com a perseguição religiosa.

64. Nos países afetados por conflitos ou desastres naturais, a gestão de crises e as operações de resposta humanitária realizadas por atores nacionais ou internacionais devem incorporar o conhecimento do terreno religioso e da diversidade religiosa das comunidades afetadas e garantir que as respostas sejam não discriminatórias e adequadas aos valores, tradições e sensibilidades religiosas.


I. Diálogo inter-religioso, consulta e intercâmbio

65. Nas sociedades multirreligiosas, devem ser envidados esforços para construir um clima de confiança, compreensão, tolerância, e cooperação e intercâmbio inter-religiosos. Tais medidas beneficiam toda a sociedade e são elementos essenciais da boa governança.

66. Os Estados devem considerar a criação ou facilitação de instituições nacionais e regionais que visem promover o diálogo inter-religioso e projetos que promovam uma cultura de compreensão e um espírito de tolerância. Deve ser encorajado o estabelecimento de instituições e plataformas formais e informais nacionais e locais para o diálogo, onde representantes de grupos religiosos se reúnem regularmente para discutir questões de interesse comum.

67. O potencial dos líderes religiosos e políticos para ajudar a construir sociedades tolerantes e inclusivas, e para iniciar e apoiar tais esforços e atividades, deve ser aproveitado. Essas figuras influentes comunitárias e nacionais devem estar na vanguarda dos esforços de diálogo e coesão intercomunitária, e de condenação pública de qualquer defesa do ódio religioso, da discriminação, da hostilidade ou da violência. Os partidos políticos devem também promover a participação, a tolerância e o diálogo.

68. As iniciativas relativas ao diálogo inter-religioso devem ser as mais inclusivas possível e devem ser encorajadas ao nível de base. A participação das mulheres e dos jovens pertencentes a minorias religiosas deve ser particularmente encorajada e assegurada por meio de uma ação ativa. Deve também ser promovida a utilização de diferentes canais de comunicação para promover o diálogo e o intercâmbio inter-religioso, como os meios de comunicação social, as artes e as instituições locais.


NOTAS DE RODAPÉ:

1 Veja as recomendações anteriores do Fórum em A/HRC/10/11/Add.1, A/HRC/13/25, A/HRC/16/46, A/HRC/19/71 e A/HRC/22/60.