A Declaração do Rio Negro resulta de uma construção colaborativa envolvendo pessoas vinculadas a diversas instituições religiosas, inter-religiosas, da sociedade civil e da academia. Por meio de um processo participativo, o documento foi adotado simbolicamente em Manaus, Amazonas (Brasil), no dia 31 de outubro de 2025, às margens do Rio Negro. A Declaração é um instrumento aberto, disponível para ser utilizado por qualquer pessoa, comunidade ou movimento comprometido com a defesa da vida em todas as suas formas.
O documento fundamenta-se em uma rica tradição de pronunciamentos e perspectivas sobre meio ambiente e clima, incluindo textos religiosos, declarações, encíclicas, convenções, compromissos, relatórios e experiências de numerosas tradições religiosas, espirituais, éticas e culturais.
Entre os movimentos e iniciativas que inspiraram este processo dialógico, destacam-se: Rede Amazonizar, Fórum Inter-religioso do G20 (IF20), Iniciativa Inter-religiosa pelas Florestas Tropicais (IRI), Iniciativa Fé pela Terra, Instituto de Estudos da Religião (ISER) e sua iniciativa Fé no Clima, Associação de Mulheres Indígenas do Alto Rio Negro - Numiã Kurá (AMARN), Instituto Witoto, Programa de Ação Climática do Parlamento das Religiões Mundiais, Tapiri Ecumênico e Inter-religioso, Coordenadoria Ecumênica de Serviço (CESE), iniciativa Fé pela Biodiversidade, Al-Mizan, Pavilhão da Fé, Aliança Evangélica Mundial, Tearfund, Iniciativa das Religiões Unidas (URI), Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB), Movimento Laudato Si’, Rede Eclesial Pan-Amazônica (REPAM), Comissão de Ecologia Integral da Arquidiocese de Manaus, Articulação Amazônica dos Povos Tradicionais de Matriz Africana (ARATRAMA), Servicio Internacional Cristiano de Solidaridad con los Pueblos de América Latina “Mons. Óscar A. Romero” (SICSAL), Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA) e Centro Brasileiro de Estudos em Direito e Religião (CEDIRE).
“Assim como o encontro das águas do Rio Negro e do Solimões dá origem à imensidão do Rio Amazonas, este encontro de lideranças religiosas, espiritualidades, povos indígenas e comunidades tradicionais, ativistas e acadêmicos, potencializou uma única voz: a da Declaração do Rio Negro. Esta Declaração carrega o calor e a generosidade da Amazônia, que é o ‘Coração do Mundo’. Não é apenas um documento técnico; é um clamor espiritual, moral e ético por um novo pacto global pela vida. Nós, que estivemos aqui, reafirmamos o compromisso de construir um Outro Mundo Possível, onde a dignidade humana e a saúde do planeta caminhem juntas. Um mundo onde todos sejam respeitados em seus direitos, e onde a fé, a ciência e a ação se unam como parte das respostas urgentes que o nosso mundo tanto precisa. A COP30 deve ser a COP da Implementação, e nós estamos prontos para agir.”
Revdo Iuri Lima, Coordenador da Rede Amazonizar e Clérigo da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil.
“Quando olho para essa crise climática, penso que se trata, sobretudo, de uma crise espiritual, no sentido de que perdemos a capacidade de nos entender como natureza. Passamos a ser uma humanidade desumana em relação à natureza porque essa estrutura econômica exploratória olha para esse ser sagrado que é a natureza como mero recurso natural. E ‘recurso’, dentro desse olhar capitalista, é extremamente violento, voraz e destrutivo, o que tem levado esse planeta a sucumbir. Portanto, precisamos fazer um movimento de repensar o nosso estar neste mundo a partir dessa espiritualidade. Nossos povos indígenas são povos que se relacionam de forma espiritual com a Terra porque a consideram sagrada: consideramos o rio sagrado como nosso avô, consideramos a Terra como nossa mãe sagrada, consideramos a floresta como nossa irmã sagrada. A natureza é um ser vivo e é um parente. E, como parente, merece existir, merece estar viva e ter seus direitos garantidos.”
Vanda Witoto, Liderança indígena e Diretora do Instituto Witoto.
"A superação da crise climática e ambiental que enfrentamos exige transformações profundas na forma como nos relacionamos com a natureza. É urgente cuidar com responsabilidade das florestas, das águas, dos solos, da atmosfera e da biodiversidade — bens sagrados que sustentam a vida. As lideranças religiosas têm papel fundamental nesse processo, pelo seu imenso potencial educativo, pela capacidade de mobilizar ações nos territórios, de influenciar o debate público e de incidir nas políticas que moldam nosso futuro comum. Esta Carta expressa e reafirma esse compromisso."
Carlos Vicente, Coordenador Nacional da Iniciativa Inter-religiosa pelas Florestas Tropicais (IRI)
“O encontro foi muito importante para consolidar nossa caminhada e nossa força à luz da ecologia integral, do cuidado da Casa Comum e da Laudato Si'. É uma experiência que reforça o reconhecimento da dignidade da vida e da vida em abundância para todos. A religião, enquanto experiência do sagrado, confere um sentido especial à nossa existência. Foi enriquecedor podermos dialogar e encontrar tantas pessoas que compartilham dessa mesma visão e compromisso. Juntos, construiremos esse caminho de comunhão com a Criação e com todos os seres humanos, reconhecendo que é possível vivê-lo em fraternidade, como verdadeiros irmãos e irmãs."
Frei Paulo Xavier Ribeiro, Coordenador da Comissão de Ecologia Integral da Arquidiocese de Manaus.
“A urgência e gravidade da crise climática exigem um choque ético para tomada de posições e decisões ousadas em prol da vida e do bem-viver no planeta. Portanto, ciência, espiritualidade e política precisam somar saberes e esforços, em diálogo com povos originários, para justiça socioambiental de toda a natureza, que inclui seres humanos. É o que deseja e propõe a Declaração do Rio Negro em face ao enorme desafio que temos no mundo hoje e que cobra coragem dos tomadores de decisão nesta COP 30.”
Clemir Fernandes, Diretor Executivo Adjunto do ISER Instituto de Estudos da Religião.
“A Declaração do Rio Negro é um chamado ético e espiritual à humanidade para reencontrar a importância de viver em comunhão harmoniosa com a Terra. Nascida às margens do Rio Negro, sua voz ecoa para o mundo como manifestação vigorosa do compromisso coletivo de cuidar da nossa Casa Comum. Tive a honra de participar dos debates que culminaram na redação final deste documento histórico, cuja mensagem traduz a convergência entre fé, ciência e esperança. Como educador e pesquisador da Universidade Federal do Pará, reafirmo meu endosso a esta Carta, que reconhece na Amazônia o coração pulsante da nossa Casa Comum.”
Ivo Pereira da Silva, Professor da Universidade Federal do Pará.
“A crise climática constitui uma grave violação de direitos humanos: o direito à vida, à água, à alimentação e a um meio ambiente limpo, saudável e sustentável são negados diariamente às populações mais vulneráveis do planeta. A Declaração do Rio Negro, proclamada na Amazônia, traduz em compromissos éticos o que a ciência confirma e o direito internacional determina. A COP30 deve estabelecer mecanismos vinculantes que protejam os direitos dessas populações, reconhecendo que não há dignidade humana sem ação climática justa e equitativa.”
Rodrigo Vitorino Souza Alves, Pesquisador Líder do Centro Brasileiro de Estudos em Direito e Religião (CEDIRE) e Professor da Universidade Federal de Uberlândia (UFU)
"Os desafios climáticos, tão amplamente alardeados desde o início dos anos 90, tanto pelos relatórios do IPCC como pela Eco 92, somente agora parecem causar os impactos pretendidos, o que em muito aumentou as responsabilidades de toda a comunidade internacional no que tange a refletir, denunciar e agir para buscar dirimir os efeitos das crises ambientais, face às controvérsias, incompreensões e interesses diversos que travam a assunção de responsabilidades pelos países. A sociedade, por suas organizações e especialmente as religiões, as tradições, as igrejas e as lideranças religiosas, pela força de sua capilaridade, tem envidado esforços no sentido de promover o conhecimento acerca destas realidades climáticas, a exemplo da encíclica Laudato Si'. Nesta linha, a Declaração do Rio Negro vem se somar com um diferencial que nenhuma outra iniciativa possui, qual seja, o fato de nascer na Amazônia, representando as vozes daqueles que são verdadeiramente a expressão da defesa da vida, da biodiversidade, dos rios e das florestas: os povos amazônicos, as espiritualidades ancestrais das populações originárias e as organizações religiosas comprometidas com a preservação da vida na Terra. Enquanto United Religions Initiative - URI, saudamos e nos unimos com muita esperança a este marco que é a Declaração do Rio Negro."
Elianildo da Silva Nascimento, Membro brasileiro no Conselho Global da URI